quinta-feira, 5 de abril de 2012

Mágica


...era doce o som daquele riso despreocupado, ainda mais saindo de um homem daquela idade, com seus já cinqüenta e poucos anos.
- o que você acha tão engraçado moço? Perguntou a criança que estava sentada a seu lado na calçada.
- me diz uma coisa moleque, você sabe contar até quanto?
A criança mal vestida, com o rosto e mãos cobertas por grossas camadas de sujeira, não hesitou em abrir as duas mãos fitando-as – um pouco mais que isso aqui! – disse mostrando seus dedos magros ao velho.
O velho tentou conter a gargalhada, mas não teve sucesso, de longe podiam ser ouvidos seus risos, que deixaram o menino a seu lado um pouco perplexo e pensando “O que ele acha tão engraçado nas coisas?”
Ao se recompor o velho pegou uma moeda e mostrou ao menino um velho truque de mágica, fazendo aquela velha peça de metal correr de forma suave por seus dedos e se tornar um medalhão.
-Nossa! Como você faz isso moço? Me ensina por favor!
Aquele velho homem, outrora um mágico, pegou a moeda novamente e mostrou ao menino como ele fazia, os olhos do garoto brilhavam de admiração. Como era possível fazer aquilo sem que as pessoas percebessem o truque? Sua mente mergulhava em pensamentos confusos, parecia algo tão simples e ao mesmo tempo tão mágico.
-Entendeu como funciona meu amigo? Perguntou o velho com seu costumeiro olhar admirado.
-Acho que sim, mas parece difícil.
-basta ter um pouco de pratica. Tente fazer desta vez. Você vai ver que não é tão difícil assim. Dizia o velho enquanto colocava as moedas na mão daquele garoto curioso.
Após algumas tentativas o garoto viu que realmente não era tão difícil quanto parecia, mas sua admiração havia desaparecido. De fato ele agora demonstrava certa decepção, no que disse:
-ah!! Era mais legal quando eu não sabia fazer. Agora nem parece mais tão mágico assim moço.
Como já esperado o velho soltou outra gargalhada despreocupada, as pessoas que o observavam ficavam admiradas com aquela cena, pareciam apenas 2 crianças se divertindo. Sem se preocupar com os olhares a sua volta o velho respondeu ao menino:
-Mas a mágica não esta nas mãos de quem a cria, e sim nos olhos de quem a vê!
Sem compreender o que ele disse, e com uma visão bem simples da situação, o menino indagou:
-Mas como assim? Não é você o mágico? A mágica esta nas mãos do mágico, né?
-Nem sempre moleque. Um dia você vai entender.
Após cerca de duas horas sentado naquela calçada, com um menino de rua como companhia, o qual ele conhecera naquele mesmo dia, vendendo bala em um semáforo próximo dali, o velho pergunta ao menino:
-Hey moleque, esta gostando de aprender esse truque?
-Sim, mas agora a mágica não é tão divertida quanto era antes. Me diz moço, por que você esta aqui me ensinado isto? Você não deveria esta fazendo mágica pra ganhar dinheiro? Não é isso que os mágicos fazem? Será que eu posso ganhar dinheiro fazendo isso?
Novamente aquela gargalhada que já se tornou a marca registrada do velho.
-Calma ai moleque, uma pergunta de cada vez. Você pode ganhar dinheiro com isso sim, por isto te ensinei o truque. E não! Não é só por dinheiro que um mágico trabalha. Alguns apenas buscam criar a verdadeira magia, este já seria por si só, o truque mais recompensador de todos.
-E qual é essa mágica? Desaparecer de verdade? Perguntou o garoto, voltando a mostrar olhos admirados
-Não, na verdade a mágica verdadeira é você criar esperança onde não há. Respondeu o velho dessa vez com um sorriso satisfeito no rosto.
-E você já conseguiu isso? Como é?
-Sim – disse soltando um riso baixo – na hora certa você compreendera isso meu amigo. Sei que o dia esta sendo divertido, mas tenho que ir agora. Que tal continuarmos nossa lição amanha? Aqui mesmo, a tarde. O que você me diz?
Sem pensar direito o garoto já respondeu que estaria amanha ali, durante a tarde esperando o velho.
-Mas ei moço, por que você esta me ensinando isso? A maioria das pessoas nem olham pra mim por eu morar na rua.
-E elas estão certas em ignorá-lo? Perguntou o velho com um ar sério, mas que não conseguia dissipar a satisfação daquela conversa em seu rosto.
-Não, mas...
-Mas eu não tomo atitudes sem um motivo, isso responde a sua pergunta? Respondeu o velho cortando o comentário do garoto
Agora o menino estava de cabeça baixa, notava-se de longe um ar melancólico sobre tão pobre criatura, e para os que estavam próximos, podia-se notar também uma lagrima em seu rosto. Ele levantou seu rosto lentamente, demonstrando clara vergonha de suas lagrimas, e segurando a camisa do velho falou.
- Ei moço, obrigado. Obrigado por conversar comigo ta.
O velho, agora sentindo total satisfação de sua conquista retrucou:
-Eu que deveria agradecer por você tirar seu tempo pra conversar com esse velho aqui. Um dia você descobrira que você me ajudou mais hoje do que acha que eu te ajudei.
E deixando o garoto ali, parado, ainda tentando absorver aquela tarde, ele partiu com passos lentos e leves, como se nada mais importasse naquela tarde, afinal ganhara um amigo novo, um amigo que poderia salva-lo de seus demônios, e que ele ajudaria a se reerguer na lama, afinal via aquela criança como uma lótus. Uma comparação que de inicio nem ele mesmo havia compreendido, mas sentia que havia algo em comum, talvez ele conseguisse naquela criança fazer brotar a mágica verdadeira, a qual ele sempre admirou.

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